quinta-feira, 28 de junho de 2007

Vou te jogar na cama...

Foi-se o tempo em que os homens cantavam ao pé-do-ouvido uma música que deixasse as mulheres de pernas bambas ou as embalasse no compasso durante um velho e delicioso forró. Digo isso porque mais ou menos uns dez anos antes de nascer eu já era forrozeira e posso garantir não há nada melhor do que ouvir clássicos do tipo “vem morena pros meus braços, vem morena, vem dançar, quero ver tu requebrando, quero ver tu requebrar...”, que certos galanteadores já fizeram o favor de transformar em “vem Myllena pros meus braços...” – e olhe que eu caia direitinho na contada...

De uns tempos para cá, as sub-músicas só ensinam os rapazes a entoarem pornografias... Com as ofertas que andam circulando por aí, ou melhor, por aqui e acolá, praticamente sonypresentes, comecei a achar que dançar forró deixou de ser coisa de moças de família, passando a consistir em uma prática quase prostitucional! Não consigo entender cenas nas quais casais dançam agarradinhos, de olhos fechados, balbuciando canções do tipo “passe a mão na bunda dela” ou “hoje é cachaça, mulher e gaia”, cujo crédito deve ser abonado com todo louvor à banda-sensação Cavaleiros do Forró, que, inclusive, chegou a ponto de se apresentar no programa da chiquíssima Hebe Camargo, em rede nacional!

Bom, vou lhes contar outra experiência pior, mais muito pior do que tudo que imaginei passar na vida de boa dançarina. Um sem-classe – juro que não parecia, tinha carinha de boas procedências - me chamou para uma contradança. Agarrou-me pela cintura, mexeu-se no ritmo certo e... ahhh, infeliz, cantou baixinho para tentar (PORQUE JAMAIS CONSEGUIRIA!) me seduzir: “vou te jogar na cama, vou te deixar toda nua, vou te lamber, vou te morder, safada, você vai ficar tesuda...”. Fiquei P. da vida! Imaginem... Logo eu, uma lady, sendo obrigada a ouvir uma devassidão dessas! Certo que a música tinha essa letra dos diabos e o menino, em parte, nem era tão culpado assim, mas o empurrei e saí cor-ren-do! Urgh!

Ah, e os pobres artistas da Globo que vêm para as drilhas (carnaval fora de época fantasiado de forró), em Caruaru, hã? Só recebendo um cachê bem gordo... Morri de vergonha ao ver Fernanda Lima e Marcos Pasquim em pleno trio elétrico se requebrando ao som de “tem que valer, valer, valer na cama, tem que fazer gostoso pro gozo virar lama”. ZULIVRE!

Quer constrangimento pior? Quando trabalhei em certa assessoria de imprensa, fui incumbida de acompanhar uma equipe da TV Canção Nova. Católicos fervorosos, a repórter, a produtora e o cinegrafista ficaram chocados, perplexos, estupefatos ao ouvirem uma banda testando o som no palco principal do Parque de Eventos, pólo de animação da cidade, durante o são João. Não menos de quatro vezes, tocaram: “Ô, mulher roleira; ô, mulher roleira”. Rezei para ser transformada em um mosquito e sair voando para beeem longe e não ter que encarar novamente nenhum deles. Tentei a mágica de Chapolin, mentalizando o PARANGARICUTIRIMIHUARO!, mas não deu certo, droga, não deu certo! Eu tinha de ser rápida, precisava fazer algo para dispersar a equipe, que se olhava como quem queria comentar a situação. E eu: “Vocês viram a cotação do dólar hoje? Ta calor, né?”. Ai, Deus, nada adiantou.

Mas o pior de tudo foi o dissabor de presenciar uma mulher completamente bêbada brigando por um espaço, em meio à multidão das drilhas, para mostrar a coreografia de “dança da minhoca” (clássico de Saia Rodada tocado no Domingão do Faustão). A moça não teve o menor acanhamento em pôr uma das mãos no chão – enquanto segurava uma lata de cerveja com a outra – e subir e descer o traseiro repetitivas vezes! Ô, tadinha... Vamos dar um desconto... Foi tomada por um surto alcoólico, oras...

Já tentei imaginar o que leva um pseudo-artista a compor certas letras. Talvez eles tentem (sem sucesso) acompanhar os preceitos da arte conceitual, aquela que considera a idéia, o conceito por trás de uma obra artística como sendo superior ao próprio resultado final, que pode ser dispensável – e o é!

Myllena Valença




Ver dança da minhoca em: http://br.youtube.com/watch?v=uCSr9QZL76g&mode=related&search=